Título

TRATAMENTO EXPECTANTE DO FERIMENTO CARDIACO PENETRANTE

Introdução

A ciência do trauma nas últimas décadas tem passado por atualizações importantes quanto a condutas tidas como irrefutáveis, em especial no tratamento conservador de órgãos sólidos. É deste milênio o aumento de relatos de tratamentos menos invasivos no ferimento cardíaco, incluindo o reparo video-assistido, a drenagem isolada e o manejo expectante exclusivo.

Relato de Caso

Paciente masculino, 18 anos, admitido no setor de emergência, onde chegou por meios próprios com relato de ferimento de arma de fogo de calibre .12 em tórax 40 minutos antes. Referia disparo único do agressor distando este 1,5m da vítima. Ao exame inicial, encontrava-se hemodinamicamente estável e assintomático. A ectoscopia revelava múltiplos orifícios em hemitórax esquerdo incluindo zona de Ziedller e transição toracoabdominal. Pelos achados descritos, optou-se por tomografia de tórax e abdomen contrastada para investigação de possíveis lesões.
A tomografia revelou dois fragmentos de projétil em massa ventricular e septo cardíaco, além de balim em parênquima pulmonar com mínima contusão associada, sem apresentar intercorrências pleurais ou mesmo derrame pericárdico significativo. Os demais fragmentos encontravam-se em subcutâneo.
Em função da estabilidade e mínimos achados de complicação relacionada às lesões, definiu-se pelo manejo conservador com exame físico seriado e ecocardiografias à beira-leito. O paciente apresentou excelente recuperação livre de qualquer intervenção, recebendo alta no 3o dia em bom estado geral com segmento ambulatorial planejado.

Discussão

Relatamos caso de ferimento de arma de fogo com projéteis alojados em topografia intracardíaca em massa ventricular e septo interventricular. O manejo adotado, apesar de atípico, justifica-se pelo conhecimento da cinemática e do pouco dano relacionado ao tipo de projétil em questão. Considerou-se também, o mínimo benefício relacionado à intervenção, visto que o paciente sequer encontrava-se com derrame pericárdico e a exploração cardíaca para eventual retirada dos projéteis possui muitos riscos associados e pouco benefício claramente documentado.
A literatura contemporânea vem paulatinamente mostrando um espaço cada vez maior do tratamento conservador do trauma em geral. Dados recentes da África do Sul mostram manejo satisfatório da maior parte dos ferimentos cardíacos com drenagem isolada do pericárdio por janela subxifóide, enquanto outros relatos de experiência em cenário de guerra com fragmentos de bombas e projéteis intracardíacos demonstram o mesmo sucesso que obtivemos com o manejo expectante.
Ponderamos ser factível o tratamento expectante de ferimentos cardíacos penetrantes em casos selecionados, quando apresentados estáveis, assintomáticos, sem derrame pericárdico significativo e relacionados a armamentos de baixa energia.

Palavras Chave

Traumatismos Cardíacos, Ferimentos e Lesões, Traumatismos Torácicos